9 - A BAGACEIRA - JOSÉ AMÉRICO DE ALMEIDA
O marco inicial da
segunda fase do Modernismo brasileiro é considerado o lançamento do romance A
Bagaceira, de José Américo de Almeida, em 1928. Inaugura o ciclo do “romance
nordestino” dos anos 30.
O enredo baseia-se no
êxodo da seca de 1898, descrito como "(...) Uma ressurreição de cemitérios
antigos - esqueletos redivivos, com o aspecto e o fedor das covas
podres.(...)".
Obra-prima do romance
regionalista moderno, hoje com trinta e duas edições em língua portuguesa,
edição crítica e versões em espanhol, francês, inglês e esperanto. Sua obra,
com dezessete títulos, abriga ainda ensaios, oratória, crônica, memórias e
poesia.
A história se passa
entre 1898 e 1915, os dois períodos de seca.
Tangidos pelo sol
implacável, Valentim Pereira, sua filha Soledade e o afilhado Pirunga abandonam
a fazenda do Bondó, na zona do sertão. Encaminham-se para as regiões dos
engenhos, no rejo, onde encontram acolhida no engenho Marzagão, de propriedade
de Dagoberto Marçau, cuja mulher falecera por ocasião do nascimento do único
filho, Lúcio.
Passando as férias no
engenho, Lúcio conhece Soledade, e por ela se apaixona. O estudante retorna à
academia e quando de novo volta, em férias, à companhia do pai, toma
conhecimento de que Valentim Pereira se encontra preso por ter assassinado o
feitor Manuel Broca, suposto sedutor e amante de Soledade. Lúcio, já advogado,
resolve defender Valentim e informa o pai do seu propósito: casar-se com
Soledade. Dagoberto não aceita a decisão do filho. Tudo é esclarecido: Soledade
é prima de Lúcio, e Dagoberto foi quem realmente a seduziu. Pirunga, tomando
conhecimento dos fatos, comunica ao padrinho (Valentim) e este lhe pede, sob
juramento, velar pelo senhor do engenho (Dagoberto), até que ele possa executar
o seu "dever": matar o verdadeiro sedutor de sua filha. Em seguida,
Soledade e Dagoberto, acompanhados por Pirunga, deixam o engenho e se dirigem
para a fazenda do Bondó. Cavalgando pelos tabuleiros da fazenda, Pirunga
provoca a morte do senhor do engenho Marzagão, herdado por Lúcio, com a morte
do pai.
Em 1915, por outro
período de seca, Soledade, já com a beleza destruída pelo tempo, vai ao
encontro de Lúcio, para lhe entregar o filho, fruto do seu amor com Dagoberto.
PERSONAGENS:
ü Dagoberto Marçau - Proprietário do engenho
Marzagão, simboliza a prepotência, contrapondo-se à fraqueza dos
trabalhadores da bagaceira. Considera-se "dono " da justiça e seu
código é simples: "O que está na terra é da terra". Se ele é
o senhor da terra, tudo que nela dá é da terra (ou seja, dele próprio).
"Se ele é o senhor da terra, tudo que nela se encontra lhe pertence, até os
próprios homens que trabalham no engenho. Assim pensa e assim age. Seduz
Soledade, vendo na sertaneja semelhança com sua ex-mulher.
ü Lúcio - Humano, idealista, sonhador, apaixona-se por
Soledade, com quem mantém um romance puro. Não compartilha as idéias de seu
pai, Dagoberto Marçau, para quem "hoje em dia não se guarda mais na
cabeça: só se deve guardar nas algibeiras. "Acreditava que se podia
desmontar a estrutura anacrônica do engenho: "Quanta energia mal
empregada na desorientação dos processos agrícolas! A falta de método
acarretava uma precariedade responsável pelos apertos da população misérrima. A
gleba inesgotável era aviltada por essa prostração econômica. A
mediania do senhor rural e a ralé faminta".
ü Soledade - Filha de Valentim Pereira, representa a beleza
agreste do sertão. Aos olhos de Lúcio, a sertaneja. "não correspondia pela
harmonia dos caracteres às exigências do seu sentimento do tipo humano.
Mas, não sabia por que, achava-lhe um sainete novo na feminilidade indefinível.
As linhas físicas não seriam tão puras. Mas o todo picante tinha o sabor
esquisito que se requintava em certa desproporção dos contornos e, notadamente,
no centro petulante dos olhos originais."... "Era o tipo modelar de
uma raça selecionada, sem mescla, na mais sadia consanguinidade."A
presença da sertaneja no engenho colocará uma barreira ainda maior entre
Dagoberto e Lúcio. Por Soledade Valentim se torna assassino e Pirunga
causa a morte do senhor de engenho.
ü Valentim Pereira - Representa o sertão: destemido,
arrojado e altivo. Como bom sertanejo pune pela honra de uma mulher, mata o
feitor Manuel Broca, apontado como sedutor de sua filha. Mas a "ideia
fixa da honra sertaneja" vai além: a cicatriz que lhe marcava o rosto era
resultado de uma briga mortal com um amigo, que desonrara uma moça, neta
de um "velhinho", de quem o tempo quebrara as forças. O diálogo entre
Valentim e Brandão de Batalaia (assim se chamava o "velhinho")
é bem ilustrativo: "Que é que vossamecê manda? Ele respondeu que só
queria era morrer. Eu ajuntei: E por que não quer matar?...”
ü Pirunga
- Filho de criação de Valentim Pereira, a quem tributa lealdade. Ama
Soledade, mas seu amor não encontra receptividade. Assim como Valentim,
simboliza o sertão: valente, intrépido, altivo... Por ocasião da festa no
rancho , vai em defesa de Latomia: enfrentando a polícia."O sertanejo
fazia frente a toda tropa na confusão do conflito corpo a corpo. Seu olhar
fuzilava na treva como um sabre desembainhado."
O relato abre o ciclo
do romance de 1930, entre outras razões por sua força de denúncia dos horrores
gerados pela seca.
É digno de nota o
prefácio que vale tanto ou mais do que próprio texto narrativo. Destaque para o
espanto do escritor face às mazelas: "Há uma miséria maior do que morrer
de fome no deserto: é não ter o que comer na terra de Canaã."
Na narrativa há um
choque de três visões que correspondem
a três processos socioculturais
distintos:
1) Visão
rústica dos sertanejos, com seu sentido ético arcaico.
2) Visão
brutal e autoritária do senhor de engenho, representando a velha
oligarquia.
3) Visão
civilizada (moderna, urbana) de Lúcio, traduzindo um novo comportamento de
fundo burguês e
que logo seria autorizado pela Revolução de
30.
Significativo é o
projeto modernizador do personagem Lúcio ao assumir o comando do engenho:
alfabetização dos filhos dos trabalhadores, melhores condições de habitação,
etc. Ou seja, aquilo que Getúlio Vargas proporia nos anos seguintes como
alternativa para o país.
O livro apresenta uma
mistura (mal resolvida) de linguagem tradicional - dominada por um tom
desagradavelmente sentencioso - com um gosto modernista por elipses e imagens
soltas, e ainda pelo uso de algumas expressões coloquiais ou regionais.
Fora sua notável
importância histórica, A Bagaceira é um romance frustrado por causa do excesso
de análise sociológica. É como se a ânsia do autor em tudo explicar, destruísse
todo e qualquer efeito sugestivo da narrativa. Luís Costa Lima explicitou bem
esse defeito: " A falha central do novelista é a sua incapacidade de
ultrapassar o realismo mais primário."
10 - INCIDENTE EM
ANTARES → ÉRICO VERÍSSIMO
O último romance do escritor Érico Veríssimo, foi
publicado no ano de 1971. A obra, enquadrada no estilo modernista, é de cunho
político e está dividida em duas partes em que os acontecimentos reais se
misturam à ficção.
Na primeira
parte da obra, o autor nos apresenta a
fictícia cidade de Antares e as relações políticas entre as facções dos Campo
Largo e dos Vacariano até o dia do famoso incidente.
A cidade de Antares é um pequeno município do Rio
Grande do Sul que em sua concepção, em 1853, fora comandada por Chico Vacariano
até que um oponente, Anacleto Campo Largo, aparece para disputar o domínio do
feudo, dando origem à rivalidade entre as duas famílias por cerca de sete
décadas.
Com o passar do tempo e com o advento da modernidade,
na década de 30, a cidade recebe a vista de Getúlio Vargas que consegue aplacar
a rivalidade entre as duas famílias e consegue formar uma aliança entre eles.
Com o tempo, a cidade vai seguindo os
acontecimentos políticos: a ascensão de Getúlio Vargas ao poder, inaugurando o
Estado Novo; a queda dele; o governo de Dutra; o retorno triunfante de Getúlio
em 1951; o atentado a Lacerda, combatente feroz de Getúlio; o suicídio de Getúlio;
a eleição de JK; a construção de Brasília; o governo de Jânio Quadros que fora
obrigado por forças terríveis a desistir do cargo, entre outros acontecimentos
da história brasileira até que, em 1963, ocorre o incidente mencionado no
título do livro.
Morrem na cidade, inesperadamente, sete pessoas
entre eles a matriarca da família dos Campolargo, mas os coveiros, estando em
greve, se recusam a enterrar os mortos que adquirem “vida” e passam a vasculhar
a vida de seus familiares e a apontar os defeitos e a podridão moral da
sociedade.
Os defuntos exigem que as autoridades os enterrem
em um prazo máximo de 24 horas ou prometem ficar a apodrecer no coreto da
cidade. Enquanto esperavam por uma resolução do governo, decidem visitar seus
amigos e parentes.
Na
segunda parte - Ao
meio dia, os mortos e os vivos se encontram na praça da cidade para discutir o
problema da greve e os mortos revelam os segredos sujos de todos da cidade.
Após um tremendo rebuliço, a greve termina, os mortos são finalmente enterrados
e a cidade decide negar e desmentir o incidente a todos os jornalistas que
procuram desvendar o que acontecera em Antares.
Por fim, a cidade segue seu curso e as “máscaras”
são gradativamente recolocadas.
11 - O TEMPO E O VENTO → ÉRICO VERÍSSIMO
Trata-se de um
conjunto de sete livros, que conta à história da formação do povo Rio Grande do
Sul, Érico Veríssimo de uma maneira original e fascinante mistura ficção com
fatos da realidade político e social do Brasil: como a guerra dos Farrapos, a
era Vargas, entre outros.
A obra divide-se em:
ü O Continente;
ü O Retrato;
ü O Arquipélago.
O CONTINENTE - A história remonta ao século XVII,
época da evangelização dos jesuítas, e o encontro de um índio, Pedro
Missioneiro, criado pelos padres jesuítas e Ana Terra, do encontro dos dois
nasce Pedro Terra. Ana Terra é obrigada a partir em caravana, quando
castelhanos invadem a fazenda da família, matam seu pai e irmãos e a violentam,
mas ela consegue esconder o filho, chegam então ao lugar que mais tarde se
tornaria a cidade de Santa Fé, onde se passa toda a trama. O romance passa-se
por várias gerações da família Terra, Cambará, Caré e Amaral, Pedro Terra
cresce e tem uma filha Bibiana Terra, que se casará com capitão Rodrigo
Cambará, moço muito bonito e galanteador, com espírito desbravador e
aventureiro, que morre em batalha.
O RETRATO- No início do século XX, Licurgo Terra
Cambará, e seus filhos Toríbio e Rodrigo vivem no Sobrado, a casa mais bonita e
famosa da cidade, o primeiro é homem rude e ama o campo, já Rodrigo gosta de
luxo e vai estudar medicina em Porto Alegre, de onde volta com todas as
novidades da época, como gramofone, vinhos, conservas, etc. Vive em conflito
com o pai que é homem conservador e não se deixa seduzir pela sofisticação do
mundo moderno. Rodrigo volta também com a ideia de exercer a profissão, se
casar, para esquecer a vida regada a mulheres e muito dinheiro que teve na
capital, quer se tornar “homem sério”, já seu irmão Toríbio vive de aventuras.
Rodrigo, bonito, vaidoso, e galanteador, mesmo depois de casado continua a ter
aventuras. No auge de sua mocidade, um amigo seu espanhol, pinta seu retrato em
tela gigante, que se torna sua uma espécie de ponto de reflexão e comparação
para Rodrigo, em todas as épocas de sua vida.
O ARQUIPÉLAGO- Rodrigo passa por várias fazes em sua
vida, após a morte da filha que mais adorava Alicinha, ele larga o ofício de
médico e vai para a carreira política, onde se envolve em negociações não muito
corretas, como troca de favores e tráfico de influências. No final de sua vida
ele já doente, e de cama, após um ataque no coração, não encontra o apoio em
sua família, sua esposa se quer dirige-lhe a palavra, arrasada e machucada após
as várias aventuras do marido, seus filhos não o admiram e não concordam com
seu tipo de vida, e estão mais interessados na herança. A história passa a ser
contada sob o ponto de vista de Floriano, filho de Rodrigo, que representa o
lado oposto do pai, reflexivo e tímido, vive o trauma de nunca ter tido a
admiração do pai, pelo fato de ter se acovardado na frente de um campo de
batalha. Fato que rebaixava o rapaz, por ter tido em seus antepassados grandes
guerreiros, e todos morridos em combate. E também sob o ponto de vista de
Silvia, agregada da família, que tem um amor platônico por Floriano, mas acaba
se casando com seu irmão, por conveniência, os dois tem uma vida infeliz e
vazia, e Silvia não consegue engravidar, para desgosto de todos.
O romance acaba com a
morte de Rodrigo e o fim de toda aquela geração, que já não seguiriam os passos
do pai. Encontramos nesta obra, romance, aventura e análises psicológicas
profundas que segundo informações são os questionamentos do autor diante de
seus conflitos com a família e a própria vida, no final o abraço entre Rodrigo
e Floriano, representa o perdão do próprio Érico ao pai e a si mesmo.
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